Thursday, February 13, 2014

Objetivos, sim. Metas numéricas, não!

“Crescer o volume de vendas em 30% até Dezembro de 2007”; “Reduzir o custo de manufatura em 20% até o final do semestre”… Será que estabelecer metas numéricas é realmente indispensável? Minha opinião (e olha que W.E. Deming concorda comigo) é que, além de ser perfeitamente dispensável, na grande maioria dos casos o estabelecimento de metas numéricas é até prejudicial, tanto para a empresa como para as pessoas envolvidas no cumprimento da meta! É claro que é indispensável ter objetivos claramente definidos, e é fundamental avaliar o progresso com base em indicadores de desempenho. Mas não necessitamos de metas numéricas declaradas “a priori” para que as coisas aconteçam. Apresento os seguintes argumentos para sustentar esta afirmação ousada:

1) A premissa fundamental (tacitamente assumida) por detrás da prática de estabelecer (e cobrar) metas numéricas é que “as pessoas são acomodadas por natureza e portanto, sem a pressão do cumprimento de uma meta numérica, elas não se mobilizam”. Além de não ser compatível com a cultura de excelência necessária para ser competitivo hoje em dia (contando com pessoas proativas), tal premissa é simplesmente inválida. Por exemplo: numa partida de futebol com os amigos, não é preciso nenhuma meta numérica do tipo “vamos ganhar de 3×0” para que todos se dediquem com afinco ao jogo (é claro que há um objetivo – “vencer a partida” – mas não uma meta numérica). Como consultor, tenho liderado inúmeros projetos de melhoria exitosos, nos quais estabelecemos somente um objetivo inicial de melhoria do tipo “Reduzir o consumo de zinco no processo de galvanização”, sem definir de saída nenhuma meta numérica. E no final, frequentemente nos surpreendemos com resultados inesperadamente positivos.

2) É preciso entender que são as ações que levam aos números, e não o contrário. São as intervenções que realizamos nos processos de trabalho (após haver entendido profundamente os mesmos) que produzem os resultados finais desejados. A cobrança de metas numéricas pela gerência é um sintoma sinistro de um estilo de “gestão” que se impõe pelo medo, pois normalmente o não-cumprimento vem atrelado a algum tipo de punição. Além disso, é um tipo de “desobrigação” da verdadeira função da gerência, que é liderar as pessoas através do conhecimento e do exemplo. Estabelecer metas arbitrárias no início e depois de algum tempo aparecer para fazer a cobrança numa breve reunião de “status review” é um tipo de “gestão ignorante”, pois não requer da gerência nenhum conhecimento sobre a realidade do processo ou situação a ser melhorada.

3) Impor metas numéricas sobre um processo revela um profundo desconhecimento quanto à natureza da variação. Desde o ponto de vista estatístico, só existem duas possibilidades sobre o estado de um processo: ou ele está “sob controle” (isto é, somente sobre o efeito das causas intrínsecas ao mesmo) ou ele está “fora de controle” (sob o efeito de alguma causa especial, externa ao processo). Se o processo está sob controle, sua variação ocorrerá dentro de limites previsíveis, a menos que se realize uma mudança estrutural no mesmo. E é claro que neste caso a imposição de uma meta não contribui em nada para a mudança. Se porém o processo estiver “fora de controle”, seu comportamente se torna imprevisível, e o estabelecimento de uma meta sobre algo que não se pode controlar é um exercício de futilidade. Além disso, em ambos os casos, é grande o risco de trazer desorientação e frustração às pessoas envolvidas, por não poderem atingir metas desconectadas da realidade. Em outras palavras, os processos não têm ouvidos: ele simplesmente são “surdos” diante das declaração de metas impostas pela gerência.

4) A longo prazo, a prática de impor metas e cobrar seu cumprimento acaba decretando a mediocridade na organização. Se alguém é obrigado a especificar metas, e se sabe que seu bônus, sua promoção ou até seu emprego dependem do cumprimento das mesmas, é óbvio que vai definir algo conservador, que sabe que com pouco esforço pode ser atingido. Tenho vários exemplos em empresas nas quais implementamos projetos de melhoria, cuja cultura vigente praticamente obrigou a declaração de uma meta numérica no início do projeto, mas que no final, após o estudo das causas e ações sobre os processos, foram alcançados níveis de melhoria considerados “impossíveis”, superando em muito a meta inicial.
Conclusão: mobilizar as pessoas para a melhoria requer apenas que estabeleça um objetivo claro e relevante, composto de três elementos importantes: o sentido da melhoria, um indicador de desempenho e a definição de qual processo deve ser melhorado. Não sabemos e não podemos saber exatamente o quanto vamos melhorar. O resultado final só vai depender das ações de melhoria que se promovam. Metas numéricas são dispensáveis, e devem ser evitadas.

fonte: http://qualiplus.com.br/objetivos-sim-metas-numericas-nao/

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